Adaptação, resiliência e sua relevância para a segurança nacional
O aumento da intensidade e da frequência de eventos climáticos extremos explicita, cada vez mais, a necessidade de mudanças profundas nas atividades econômicas e produtivas. Recente estudo publicado na revista Nature [1], evidenciou a urgência climática: analisando mais de 100 mil estudos por meio de machine learning, pesquisadores identificaram que 80% da área do planeta, onde 85% da população global reside, já experimentou impactos físicos atribuíveis às mudanças climáticas, tais como mudanças no padrão de chuvas, temperatura, secas e enchentes.
Em 2020, a ocorrência de inundações, furacões e tempestades acentuou-se. Nos Estados Unidos, por exemplo, ¼ da população foi exposta a ondas de calor extremo no verão de 2020 [2], e houve recorde de eventos climáticos extremos, com custos estimados de cerca de US$ 95 bilhões. Estima-se que tais custos tenham totalizado mais de US$ 1,8 trilhão nos últimos 40 anos no país.
Ainda, recente pesquisa lançada pelo serviço nacional de meteorologia do Reino Unido durante a COP26 estima que 1 bilhão de pessoas podem ser expostas a calor extremo no caso de a temperatura média global aumentar em 2°C, atingindo metade da população global em um cenário de 4°C [3].
Tais dados ajudam explicar por qual motivo as mudanças climáticas e seus impactos sobre a paz e segurança internacional fazem atualmente parte da agenda do Conselho de Segurança da ONU. A mudança do clima é um multiplicador de riscos. Relatório da Chatham House [4] aponta que mudanças no padrão de chuvas, aumento da temperatura média, secas, ondas de calor, incêndios e alagamentos podem trazer graves impactos como surgimento de novas doenças, escassez de água, insegurança alimentar, redução na produtividade do trabalho diante do calor extremo, perdas de vida e de biodiversidade.
A partir de tais impactos, pode-se destacar possíveis consequências com implicações para a agenda de paz e segurança nacional. Em primeiro lugar, há o aumento da migração forçada, causando êxodo rural e eventuais crises de refugiados. Ainda, conflitos armados podem ser exacerbados, por meio de combates regionais por recursos naturais mais escassos, impulso a grupos extremistas, ao crime organizado e à violência, e até guerras civis. Por fim, como inúmeras vezes ressaltado pela Task Force on Climate-related Financial Disclosure, mudanças climáticas podem causar a desestabilização dos mercados, por meio de spikes no preço de commodities, perda de valor e venda em massa de ativos e colapso de mercados financeiros.
Alguns governos já reconhecem tais ameaças e buscam identificar suas vulnerabilidades e traçar planos de adaptação e resiliência. Ordem executiva do presidente Joe Biden no início de 2021 solicitou que todos os ministérios e agências governamentais dos EUA analisassem sua exposição aos riscos das mudanças climáticas, relatórios estes que foram lançados no final de outubro. O Departamento de Defesa, por exemplo, estima que seu Comando Sul, baseado na Flórida, pode observar crescente instabilidade e demanda da América do Sul por assistência humanitária decorrente da seca e calor na região.
Os dados e análises acima demonstram a relevância da pauta de adaptação, resiliência e sua relevância para a segurança nacional dos países. Em paralelo aos esforços de mitigação, que visam reduzir as emissões de gases de efeito estufa de modo a limitar o aumento da temperatura média global, faz-se mister que líderes, tanto de governos quanto de empresas, incorporem a temática da resiliência climática em sua tomada de decisão.
Tais temas foram debatidos em evento promovido pelo Centro Soberania e Clima, em 11 de novembro, sob o tema “Petróleo, Soberania e Sustentabilidade”. O painel contou com a participação de Clarissa Lins, Almirante Eduardo Leal Ferreira e Luiz Barroso (PSR), com comentários de Sergio Etchegoyen e moderação de Felipe Sampaio.
[1] Machine-learning-based evidence and attribution mapping of 100,000 climate impact studies | Nature Climate Change
[2] Heat-related symptoms affected one-quarter of Americans in summer 2020 | NSF – National Science Foundation
[3] One billion face heat-stress risk from 2°C rise – Met Office
[4] 2021_Chatham House_Climate change risk assessment 2021
Foto: Kelly Sikkema via unsplash.com
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