Políticas públicas e sinalizações da demanda como importantes drivers
Como um material permanente que pode ser reciclado continuamente sem perder suas propriedades, o aço é fundamental para a sociedade atual e futura. Sua produção cresceu substancialmente desde a década de 1990, de 0,77 bilhões de toneladas em 1990 para 1,88 bilhões de toneladas em 2020, principalmente devido ao aumento da produção na China desde a virada do milênio [1]. A produção de aço é fortemente dependente do carvão, sendo o setor atualmente responsável por cerca de 7-9% das emissões globais de CO2, onde cada tonelada de aço produzida leva à emissão de 1,85 tCO2 [2].
Em meio ao crescente reconhecimento da crise climática e da necessidade de transição para uma economia de baixo carbono, a produção do material precisará ser dissociada de suas emissões. A Agência Internacional de Energia (IEA, em inglês) estima que, embora a produção de aço deva aumentar marginalmente até 2050 em um cenário net zero (+ 12% em relação aos níveis de 2020), as emissões do setor precisam ser reduzidas em 25% até 2030 e 92% até 2050 [3].
Nesse contexto, dois principais fatores estão impulsionando a descarbonização do aço: políticas climáticas mais rígidas e compromissos da cadeia de valor que podem fomentar a demanda por aço de baixo carbono. É cada vez maior o número de metas de neutralidade líquida de emissões (net zero) nacionais, que já abrangem 70% das emissões globais de CO2 e do PIB mundial [4]. A indústria siderúrgica da União Europeia está sob pressão devido ao aumento do preço do carbono do EU-ETS (US$ 55/tonCO2e em maio), com um mecanismo de ajuste de fronteira de carbono em discussão. A China, responsável por quase 60% da produção global de aço, está avaliando uma meta para o pico das emissões do setor até 2025, com uma redução subsequente de 30% até 2030.
Ao mesmo tempo, os setores imobiliário, de infraestrutura e de equipamentos mecânicos e elétricos, responsáveis por mais de 70% da demanda global de produtos siderúrgicos, têm se comprometido a adquirir aço 100% net zero até 2050, com metas intermediárias para o uso do aço com menor conteúdo de carbono até 2030, em meio à iniciativa SteelZero [5]. No setor automotivo, as metas climáticas, incluindo as emissões do escopo 3 – e, portanto, as emissões da cadeia siderúrgica – estão em alta, assim como novos modelos de parceria. A Volvo e a SSAB, por exemplo, anunciaram um acordo para desenvolver o primeiro carro construído com aço verde.
Neste cenário, o setor siderúrgico está respondendo à pressão crescente por meio do compromisso gradual de líderes da indústria com metas net zero. Cinco das seis maiores siderúrgicas globais já se comprometeram, incluindo as maiores empresas chinesas, europeias e japonesas.
Apesar do aumento das ambições no setor, os desafios para a descarbonização do aço são relevantes. Quase 2/3 das tecnologias necessárias para a descarbonização da indústria até 2050 ainda não estão maduras [6], sendo que a implantação destas iniciativas pode levar a aumentos substanciais de custos. A IEA estima que o custo adicional de produção pode ficar entre 10% e 50% em comparação com os níveis de 2020 em um cenário de emissões mais baixas. Isso ocorreria devido a três fatores principais:
– Aumento de custos operacionais – uso de recursos de baixo carbono mais caros, como hidrogênio verde ou eletricidade de baixo carbono, equipamentos para CCS e preços mais altos de carbono;
– Aumento dos custos de capital e P&D – substituição de carvão na rota BF-BOF; conversão de equipamentos para uso de hidrogênio; retrofit de infraestrutura para CCUS; e desenvolvimento de tecnologias disruptivas;
– Diferenças na viabilidade comercial entre as regiões – incentivos governamentais, regulamentação e precificação do carbono devem impactar a competitividade das tecnologias de baixo carbono e o ritmo de implementação em diferentes localidades.
Embora o cenário seja desafiador, uma mudança de paradigma pode – e deve – apoiar a descarbonização do aço. O apoio de políticas públicas é necessário para incentivar empresas pioneiras, fomentando assim a demanda por aço de menor carbono, possibilitando o financiamento da transição e apoiando o desenvolvimento tecnológico. Ao mesmo tempo, a demanda social e os sinais dos clientes são cruciais para impulsionar a descarbonização em todas as cadeias de valor, além de garantir a licença para operar da siderurgia. Por fim, o boom ESG no setor financeiro deve ser visto como uma oportunidade para financiar a descarbonização de setores carbono-intensivos, pois quanto maior o desafio, maior o retorno e o impacto.
Estas ideias foram apresentadas por Clarissa Linsna Conferência CRU Steel Decarbonisation Strategies 2021, onde a sócia fundadora da Catavento moderou um painel de discussão com líderes da indústria de minério de ferro e do aço, sendo eles Stephen Potter (Vale), Stefan Savonen (LKAB) e Annemarie Manger (Tata Steel Europe).
[1] World Steel Association – “World Steel in Figures 2020”. 2021
[2] World Steel Association – “Climate change and the production of iron and steel”. 2021
[3] IEA –“Net Zero by 2050: a roadmap for the global energy system”. 2021
[4] IEA –“Net Zero by 2050: a roadmap for the global energy system”. 2021
[5] The Climate Group – “Steel Zero”. 2021
[6] IEA – “Iron and Steel Technology Roadmap: Towards more sustainable steelmaking”. 2020
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